domingo, 26 de outubro de 2014

As Dificuldades do Amor

Essa madrugada eu recebi uma mensagem de uma pessoa dizendo “Eu te amo”.

Não era de parente nem do namorado. Era uma amiga me incluindo numa dessas correntes sentimentais de WhatsApp.

Sorri por dentro e respondi com carinho. Comecei a puxar da memória as pessoas que amei e as pessoas que amo... As que já se declararam para mim e as para as quais me declarei...

Nunca disfarcei como é difícil pra mim o afeto de maneira geral.Nunca consegui esconder minha inabilidade em dar carinho e em cuidar. Mesmo que estas sejam tendências minhas.

Lembro de uma vez em que um amigo me contou que costumava retirar o salário quase todo da conta bancária no dia do pagamento. No dia pensei no risco que ele corria de ser pego numa dessas “saidinhas de banco” e morrer baleado. Não hesitei em passar um sermão “daqueles” chamando ele de burro irresponsável e insistir que era muita ignorância fazer uma coisa dessas com todas as possibilidades de transações  eletrônicas disponíveis hoje em dia. Ele ouviu atônito e respondeu: “Tá certo. Vou lembrar disso mês que vem. E apesar da bronca eu gosto do jeito Nadia de cuidar”.

E eu vi que era isso aí. O que ele quis dizer com a expressão “jeito Nadia de cuidar” era que eu era estúpida, mesmo com as melhores intenções.

Cresci numa família dura e conto nos dedos as vezes em que as palavras “eu te amo” foram ditas em casa (aliás, nos dedos de uma mão...e ainda sobram). A consequência disso é que simplesmente não sei o que fazer pra entregar meu amor. Manifestações de carinho me constrangem e me inundam duma sensação de desconforto.

Tipo quando a mãe da minha amiga morreu e ao invés de telefonar ou comparecer eu me limitei a chorar minha falta de tato na terapia, mandar um recado no face e corroer a culpa por não ter feito nada mais além disso. Ou quando meu primo foi assassinado e eu não sabia o que dizer para a irmã dele quando ela foi em casa semanas depois. Ou ainda quando minha super amiga amada perdeu o filho esperado com tanta expectativa e eu não soube dar mais que um sorriso amarelo quando nos encontramos (e olha que o bebê perdido seria meu afilhado).

Li em algum lugar uma vez que amar é admirar com o coração e que admirar é amar com o cérebro.
De certa forma acho que é isso que me afasta das pessoas que amo. No fundo queria ser um pouco mais como cada uma delas e me sinto indigna ante a grandeza delas. Quando a mãe, o filho ou o irmão de alguém que amo morre eu penso “Caralho! Essa pessoa tem a força de Zeus pra não surtar. Eu não seguraria a onda com 10% da dignidade”.

Invejo algo de cada pessoa que amo: a beleza, a simpatia, a inteligência, o carisma...enfim. Pra mim afeto e admiração andam de mãos dadas é por isso mesmo às vezes me afasto das pessoas que mais gostaria de manter próximas. Fico do lado de cá pensando que pessoas tão incríveis não devem sentir falta de alguém assim tão pequeno e desinteressante como eu. Como se pensasse que as qualidades das pessoas ás tornassem autossuficientes e indiferentes às minhas próprias qualidades.


Mas quando me chega uma dessas mensagens inesperadas eu vejo a verdade. Que toda qualidade foi feita para se complementar com as do resto do mundo e, por um segundo, me permito retribuir e me livrar do carinho não entregue.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Aquela arrogância que me dá a cada 2 anos

Neste final de semana acontecerá o grande evento da democracia brasileira. É hora de ir às urnas manifestar nosso desejo de cidadãos optando pelo candidato que acreditamos estar mais conectados com nossos valores, pessoa na qual depositaremos a imensa responsabilidade de nos governar e blá blá blá...

Mas eu particularmente não estou nem aí. Ou pelo menos eu tento. Já não é de hoje que minha fé na sociedade, no poder da democracia e sobretudo no discernimento das pessoas para uma escolha tão grande se esvaiu.

É lamentável, mas devo admitir que o único sentimento que de fato me acomete nesta época é a arrogância. A cada 2 anos tenho oportunidade de revisitar uma das épocas mais ingratas da minha vida: minha idade escolar (com destaque à tudo o que aconteceu até o primeiro colegial).

Se você não me conheceu durante a vida toda deixe-me traçar um quadro geral. Dos meus 7 aos meus 16 anos fui um legítimo peso morto social. Quase não tinha amigos, era um desastre nos esportes, meus movimentos eram de um total desengonço, minha pouca beleza era eficientemente encoberta pela minha total falta de estilo e, como se não bastasse, eu cometia o pior pecado de todos para esta faixa etária: eu gostava de estudar. De verdade.

Considerando tudo isso não é difícil imaginar que além de não ter muito carisma eu era até certo grau “rejeitada”. Não que sofresse bulling ou essas atrocidades todas que andam na moda, mas é que, além de ser completamente impopular, eu era friamente hostilizada pelas garotas mais legais, bonitas e “badaladas”.

Estou longe de ser uma pessoa traumatizada (apesar de todo o teor dramático da descrição acima). Ainda gosto de estudar, ainda sou péssima nos esportes e ainda sou desengonçada. Minha pouca beleza já consegue ser aprimorada com o mínimo de bom senso e conquistei amigos fodas que não troco por nada <3>

Sinto de verdade que o tempo me fez bem e não tenho nenhuma nostalgia dos tempos de escola. Sou hoje sem a menor sombra de dúvida uma pessoa muito mais segura e interessante. Resumindo, sou um ser humano que gosto de ser e do qual me orgulho.

E é aí que entram as eleições.

Voto na escola estadual do bairro, assim como a maior parte das pessoas que estudaram comigo até a tal época desgracenta de meus 16 anos. E admito sem a mínima humildade que me realizo mais e mais a cada eleição que passa. Graças a essa obrigação cívica tenho a chance de constatar como as “periguetinhas” esnobes do passado agiram exatamente como é de se esperar que aconteça com pessoas vazias: tornaram suas vidas rasas e enforcaram-se na futilidade. Algumas embuxaram, quase todas embarangaram e nenhuma delas construiu uma vida interessante ou que me passe a mínima impressão de felicidade e completude.

E é por essas e outras que me convenço de que irei para o inferno. Pois a cada 2 anos eu vivo meu dia secreto “d’o mundo da voltas” e, do auge de uma arrogância que não me é comum, me permito rir por dentro e dizer pra mim mesma “valeu a pena filtrar as companhias, me isolar, estudar e elevar minha alma”.

Não irei para o céu, mas chegarei no inferno de cabeça erguida...rs