quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Tudo o que morre fica vivo (cemitério na cabeça PII)



Desde sempre me encanta esta música, mas só recentemente fiz uma associação entre ela e uma dessas frases batidas que ouço com frequência: A vida é feita de escolhas.

Fiquei refletindo depois de uma conversa qualquer que, se é fato que a vida é feita de escolhas, e se, como diz o ditado, para cada escolha há uma renúncia, então podemos concluir que a vida é feita de renúncias.

Pensar nisso me causa uma enorme frustração. Afinal nunca fui muito adepta da arte do sacrifício. Tenho muito mais o perfil de quem quer se organizar para viver todas as experiências possíveis pra vida.

Mas em algum momento a ficha cai e o tempo nos mostra que as coisas não são bem assim.

Penso no conceito de renúncia como uma “não possibilidade”, algo que nunca será. É uma espécie de morte das demais opções possíveis. A morte de algo que poderia ter sido, mas não é (nem jamais será).

Me lembro que há muito tempo atrás confessei a uma pessoa que frequentemente me pegava a imaginar como minha vida poderia ter sido se eu tivesse feito algumas pequenas escolhas de forma diferente.

Ela me respondeu que se eu não experimentasse nunca saberia. Que de “e se” em “e se” eu deixaria minha vida passar sem viver de verdade.

E por simples (e até óbvia) que tenha sido a ideia, isso me influenciou de uma maneira que esta pessoa jamais saberá. Os impactos desta influência se faz sentir na minha vida até hoje.

A filosofia do Carpe Diem e do “vamos fazer o máximo de coisas para curtir vida” foi o lema da minha existência desde esta fatídica conversa. Por isso mesmo, acordar para a ideia de que é impossível “zerar” as possibilidades do jogo da vida, e de que viver consiste em abrir mão de coisas o tempo todo, fere profundamente uma parte de mim.

Cada frustração, cada escolha, cada possibilidade não vivida e cada capítulo de nossa história que fica para trás, não fica para trás de fato, mas nos persegue e influencia. Vão se acumulando e nos moldando independente de nossa vontade. É nosso cemitério particular.

Viver não é apenas a arte da escolha, do sacrifício e da convivência com o outro. Também é um exercício de maturidade para convivermos com nossos próprios calos. Não se pode mudar o que já passou. Como diz o ditado: águas passadas não movem moinhos. Da mesma maneira, não se pode mudar o passado do outro com quem convivemos. É necessário aceitar que cada um de nós é uma espécie de saco de “defuntos mentais” ambulante.

Precisamos aprender a lidar com as consequências das feridas do próximo e compreender que algumas vezes seremos nós a sofrer as consequências das ações de terceiros no passado de quem amamos.

Quanto mais intensa a vida, mais escolhas. Quanto mais escolha, mais renúncia. Quanto mais renúncia, mais passado. Quanto mais passado, maior a necessidade de aceitação do outro e resiliência.

Ou, como disse Gustave Flaubert: "Que grande necrópole é o coração humano! Para que irmos aos cemitérios? Basta abrirmos as nossas recordações; quantos túmulos!".