Essa madrugada eu recebi uma mensagem de uma pessoa
dizendo “Eu te amo”.
Não era de parente nem do namorado. Era uma amiga
me incluindo numa dessas correntes sentimentais de WhatsApp.
Sorri por dentro e respondi com carinho. Comecei a
puxar da memória as pessoas que amei e as pessoas que amo... As que já se
declararam para mim e as para as quais me declarei...
Nunca disfarcei como é difícil pra mim o afeto de
maneira geral.Nunca consegui esconder minha inabilidade em dar carinho e em
cuidar. Mesmo que estas sejam tendências minhas.
Lembro de uma vez em que um amigo me contou que
costumava retirar o salário quase todo da conta bancária no dia do pagamento.
No dia pensei no risco que ele corria de ser pego numa dessas “saidinhas de
banco” e morrer baleado. Não hesitei em passar um sermão “daqueles” chamando
ele de burro irresponsável e insistir que era muita ignorância fazer uma coisa
dessas com todas as possibilidades de transações eletrônicas disponíveis
hoje em dia. Ele ouviu atônito e respondeu: “Tá certo. Vou lembrar disso mês
que vem. E apesar da bronca eu gosto do jeito Nadia de cuidar”.
E eu vi que era isso aí. O que ele quis dizer com a
expressão “jeito Nadia de cuidar” era que eu era estúpida, mesmo com as
melhores intenções.
Cresci numa família dura e conto nos dedos as vezes
em que as palavras “eu te amo” foram ditas em casa (aliás, nos dedos de uma
mão...e ainda sobram). A consequência disso é que simplesmente não sei o que
fazer pra entregar meu amor. Manifestações de carinho me constrangem e me
inundam duma sensação de desconforto.
Tipo quando a mãe da
minha amiga morreu e ao invés de telefonar ou comparecer eu me limitei a chorar
minha falta de tato na terapia, mandar um recado no face e corroer a culpa por
não ter feito nada mais além disso. Ou quando meu primo foi assassinado e eu
não sabia o que dizer para a irmã dele quando ela foi em casa semanas depois. Ou
ainda quando minha super amiga amada perdeu o filho esperado com tanta
expectativa e eu não soube dar mais que um sorriso amarelo quando nos
encontramos (e olha que o bebê perdido seria meu afilhado).
Li em algum lugar uma vez que amar é admirar com o
coração e que admirar é amar com o cérebro.
De certa forma acho
que é isso que me afasta das pessoas que amo. No fundo queria ser um pouco
mais como cada uma delas e me sinto indigna ante a grandeza delas.
Quando a mãe, o filho ou o irmão de alguém que amo morre eu penso
“Caralho! Essa pessoa tem a força de Zeus pra não surtar. Eu não seguraria a
onda com 10% da dignidade”.
Invejo algo de cada
pessoa que amo: a beleza, a simpatia, a inteligência, o carisma...enfim. Pra
mim afeto e admiração andam de mãos dadas é por isso mesmo às vezes me afasto
das pessoas que mais gostaria de manter próximas. Fico do lado de cá pensando
que pessoas tão incríveis não devem sentir falta de alguém assim tão pequeno e
desinteressante como eu. Como se pensasse que as qualidades das pessoas ás
tornassem autossuficientes e indiferentes às minhas próprias qualidades.
Mas quando me chega
uma dessas mensagens inesperadas eu vejo a verdade. Que toda qualidade foi
feita para se complementar com as do resto do mundo e, por um segundo, me
permito retribuir e me livrar do carinho não entregue.
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